Inclui : Lhasa, Shigatse & Evereste
Chengdu – Lhasa
Nos dias de hoje na China, praticamente todos os letreiros e anúncios são todos feitos em chinês pelo que como referência na estação, apenas tínhamos o número do comboio e os números que apontavam a hora, comuns ao alfabeto chinês, ao contrário por exemplo do Bangladesh ou do Irão em que nem esses entendíamos.
O comboio era o Z322 e iria partir às 21:37. Apesar de termos tido que organizar esta travessia de Chengdu até Lhasa com uma companhia de viagens local, devido à necessidade de um convite para obtermos o visto chinês e (o mais difícil) que era a permissão para entrarmos na zona especial do Tibete, não havia ninguém à nossa espera na estação para nos ajudar no complicado processo de obtenção do bilhete ou de nos orientar dentro da estação.
Ninguém mas ninguém fala “ingrish” (english) e ainda bem que já temos experiência em viagens intrépidas e complicadas, mas temos a noção que um viajante menos experiente facilmente teria ficado por terra. Ninguém nos explicou, por exemplo, que íamos precisar de mudar de comboio em Xining e todos os anúncios dentro do comboio eram feitos em chinês. Felizmente uma chinesa muito simpática com quem partilhámos a cabine arranhava 2 palavras e, depois de aceder ao google tradutor, ajudou-nos a perceber que no dia seguinte, às 12:07, teríamos que mudar para um comboio com acesso a fonte de oxigénio caso alguém demonstrasse doença de altitude.
Estivemos 24h em Chengdu a 2200 metros de altitude como mandam as regras e iríamos estar mais 24h fora da zona de risco pelo que acreditámos que seria suficiente, além da dose preventiva da dorzolamida (1/2 comprimido de 12 em 12h) que estamos a tomar desde que chegamos a Chengdu.
O comboio era bastante simples, igual ao que apanhámos entre Ulanbataar e Pequim há 2 anos atrás e ficamos numas confortáveis cabines individuais com 4 camas em beliche. Tivemos direito a um edredon e uma almofada bem limpas e inicialmente éramos apenas 3 na cabine, sendo que a meio da noite juntou-se a nós um chinês (extremamente simpático como viríamos a constatar no dia seguinte) que me deixou mais alerta em relação aos sacos e carteiras e me fez acordar de vez em quando durante a noite em modo vigilante. Jantámos ainda na estação e no comboio pouco demorou até adormecermos, a vermos mais uns episódios do Bates Motel, uma excelente série que nos tem acompanhado ao longo desta expedição.
A possível reação alérgica alimentar da Filipa deixou-nos alerta e fomos bem apetrechados para o comboio e ainda bem, porque no primeiro comboio apenas havia um bar com muito pouca coisa para tomar o pequeno-almoço e não havia café ou chá frescos. Acabámos por nos sentar numa das várias mesas da carruagem-bar a comer umas bolachas. Eu ainda consegui encontrar um café latte no supermercado e valeu bem, mas soube a pequeno almoço fraquinho.
No segundo comboio já havia todas as comodidades com um restaurante como deve ser mas com comida chinesa e infelizmente precisávamos de a evitar, sobretudo por irmos para uma altitude elevada. Havia até vasos com legumes frescos que era colhidos no momento para serem salteados no wok. O segundo comboio era bem mais confortável e tinha suplementação de oxigénio ao longo dos corredores e individualmente. Cada cama tinha também uma televisão, apesar de não ter funcionado. As casas de banho eram limpas também, apesar dos chineses não saberem usar uma sanita normal, montando-a como usam o buraco à caçador. O restaurante já providenciava diversos menus e quem se tivesse esquecido de trazer comida não passava mal.
O chinês que chegou durante a noite começou a falar pelo tradutor e depois de uma engraçada conversa de conhecimento mútuo, quis oferecer-nos uma cerveja ou bebida branca. Tivemos de recusar porque com a altitude a dor de cabeça poderia agravar. Depois quis oferecer o almoço mas igualmente tivemos de recusar por causa do risco de alergia da Filipa. Não era o que nos apetecia fazer e explicamos as nossas razões para não parecer falta de educação através do Google tradutor que mais uma vez se mostrou essencial.
Quanto à vista do comboio, mais uma vez digo que a China me impressiona por completo cada vez que cá venho. Montanhas cheias de neve, desertos de perder fim com lagos lindíssimos nos planaltos. E nada desaproveitado. Plantações, exploração mineira, energias renováveis… São imensos e o mercado interno é suficiente e exigente.
Já tínhamos feito a viagem de Pyongyang (Coreia do Norte) até Pequim e de Ulanbataar até Pequim e fiquei sempre impressionado com o desenvolvimento deste país.
Qualquer pequena cidade tem uma série de arranha céus modernos, estações de comboio e aeroportos futuristas, excelentes estradas e apesar de haver uma inquestionável poluição associada ao progresso avassalador, passámos por bastantes indústrias e centrais nucleares com chaminés imensas, notámos uma preocupação ambiental crescente e importantes passos em relação às energias renováveis.
Em Chengdu reparámos que rigorosamente todas as scooters e triciclos eram elétricos, provavelmente por decreto-lei e ao longo do caminho deparamo-nos com um sem número de (caros) postes de eletricidade que tinham não só o painel fotovoltaico como um dispositivo de aproveitamento da energia eólica. Para além disto vimos imensas torres de energia eólica e centros fotovoltaicos. Há uma preocupação com o turismo e a preservação dos parques nacionais que são simplesmente incríveis. O mundo ocidental não faz a mínima ideia do que está aqui e isto está a criar uma curiosidade imensa a mim e à Filipa como um destino de excelência, surpreendente, genuíno e intrépido como gostamos tanto e há tanto ainda que explorar neste imenso país.
O nascer do sol no dia em que chegamos a Lhasa foi memorável, com o sol a bater nas montanhas mais altas com cumes cobertos de neve. O comboio chegou aos 5800m de altitude durante a noite e eu dormi tranquilamente mas a Filipa não. Durante a noite acordou 3 vezes com falta de ar e teve de se apoiar na fonte de oxigénio junto à cama. 30 minutos antes de chegarmos à estação desligaram o oxigénio do comboio e aí sim sentimos verdadeiramente a dificuldade da falta de oxigénio sendo que cada movimento estava associado a um cansaço incomum e a falta de ar. Todos os passageiros sentiram isso e ouvíamos sempre as sábias palavras: “slowly…slowly”.
A estação era muito moderna, não estivéssemos nós em território chinês, e Lhasa já não é a cidade tradicional que imaginávamos e a chegada dos chineses plantou todo o progresso que vimos no resto do país. Para já, plantaram alguns arranha céus mas na parte norte do vale há um sem número de gruas e prédios em construção. Nos telhados as bandeiras budistas competem com bandeiras chinesas e recordam-nos que chegámos a um território ocupado pela força e que terminou vários milénios de independência e história deste resistente povo das montanhas.
Lhasa apresentou-se solarenga e fria quando chegámos de comboio, vindos de Chengdu. Depois de passarmos pela imigração, que foi feita muito rapidamente, tínhamos um tibetano à nossa espera, com dois lenços tradicionais brancos (cujo significado é dar as boas vindas e desejar paz e prosperidade) para nos levar ao nosso hotel de 4 estrelas, o Gang-Gyang Hotel, situado na avenida principal e na cidade velha, a alguns passos de algumas das atrações principais.
No caminho passámos pelo Palácio Potala, onde viveram todos os Dalai Lamas. Construído no século VII (em cima de uma montanha que antigamente tinha forma de elefante deitado) mostra-se imponente e guardião da cidade. É impossível passar por ele e não ficar boquiaberto… Devia ser incrível chegar a Lhasa nos anos 30! No topo do Palácio vê-se a sempre presente bandeira chinesa e questiono-me sobre o verdadeiro impacto que a China teve neste povo tão ligado às tradições e ao budismo, sendo a China um país comunista. Confesso que estava à espera de uma cidade pequena tipo vila, construída nas colinas das montanhas, muito tradicional, genuína e fresca. O que vi foi uma cidade evoluída com caracteres, bandeiras, comida, polícia e construção nova tipicamente chinesa, que contrastam com os adornos construtivos das casas antigas tibetanas.
Lhasa está muito desenvolvida (em nada se parece ao filme 7 anos no Tibete), sendo a cidade mais vigiada do mundo, vendo-se câmaras e polícias em cada esquina. Ainda existem alguns restaurantes tradicionais tibetanos, mas são raros, sendo os chineses predominantes. Na fase da conquista deste país, o Dalai Lama da altura exigiu que se mantivesse a língua deles e que esta fosse escrita em primeiro lugar, seguida pelo chinês e só depois o inglês. O problema é que, mesmo isto tendo sido aceite, estavam a negociar com um país mais experiente e habituado a negociações, e sendo assim impuseram que todos soubessem falar chinês para poderem trabalhar.
O nosso guia diz que tem receio que dentro de 20 ou 30 anos a língua oficial seja esquecida, por não ser usada. Espero que não se lembrem de destruir os templos e obrigá-los a esquecer o budismo, que tão puro e bonito é. É o budismo que faz haver respeito, amor, compaixão, entreajuda e a não haver crime, devido ao eminente bad karma, que tudo vê.
No primeiro dia fomos sozinhos dar um passeio pela cidade velha, com passos muito lentos, em modo caracol cansado, por causa da altitude. É fácil distinguir os chineses dos tibetanos, porque estes vestem-se de forma mais tradicional, são mais sorridentes e têm a cara mais queimada pelo sol (devido à altitude e à falta de proteção solar) e os olhos mais amendoados.
A nossa visita só começou no dia seguinte, com um casal vietnamita emigrados na Califórnia (ela com 47 e ele com 56 anos), apoiantes do Trump e contra a imigração (vai-se lá entender!), sem qualquer preparação física, apesar de ela afirmar que faz crossfit regularmente e adora trekking e hikking que pratica habitualmente. Ele nem andar direito sabia, arrastando os pés a cada passo, qual velhinho de 90 anos, mas pelo menos afirmou sempre que não pratica qualquer desporto. Se vocês a vissem a subir as escadas e a parar a cada 5 degraus, branca como cal, a justificar-se com a altitude e a agarrar-se aos pulmões, percebiam o porquê de eu achar importante mencionar. Eu, que sei que não tenho preparação, dava-lhe 10 a 0.
Num dos almoços conversámos amigavelmente sobre o Trump e o porquê de ele ter ganho e eles tentaram explicar que os americanos queriam ver os problemas internos resolvidos e só depois os assuntos estrangeiros, criticando fortemente a faceta submissa do Obama perante outros líderes estrangeiros. Falamos sobre os impostos e o sistema nacional de saúde e educação, que apoiam veemente, dizendo que não concordam com o “Obama Care”… What?? Estávamos cada vez mais perplexos com tamanha ignorância. Ainda tentámos chamá-los à razão e explicar o conceito de segurança social mas vimos que não íamos mudar a mentalidade destas pobres criaturas…
Fomos então visitar dois templos, onde era preciso subir uma série de escadas e rampas para se chegar ao templo. Mas vale bem a pena! Um dos problemas desta cidade é que o clima aqui varia muito rápido! À sombra está gelado, ao sol assam-se cérebros e quando passa o vento, a qualquer hora do dia, especialmente bem cedo de manhã e à noite, quase se formam estalactites momentâneas!
Por isso, para sair do hotel de manhã fazemos um jogo de camadas, porque vamos ter frio agora e um segundo depois podemos estar a torrar! É um crossfit só de tira e veste casacos, camisolas, luvas, gorros a cada virar da esquina. Tivemos o nosso almoço de boas vindas à entrada do Mosteiro Sera, onde vimos um debate de monges, com uma série deles num pátio, agrupados em dois, um sentado e outro de pé. Este faz as perguntas (sempre de cariz filosófico) e o sentado tem de responder com toda a sua sabedoria. As perguntas são sempre do foro da vida e da existência das coisas, sempre com direito a uma resposta sábia que é contraposta com outra pergunta a questionar a sabedoria de quem responde. No momento da contra pergunta o monge bate com as mãos uma na outra, bem na cara do monge sentado, que em determinadas alturas fazia uma cara de poucos amigos.
Ficámos a saber que os tibetanos não têm direito a passaporte. Podem viajar dentro da China, mas mesmo assim têm de pedir ao estado uma permissão para irem para determinada zona da China. E se quiserem lá ficar, têm de comprar ou construir casa e arranjar emprego no local. Em conversa com o guia sobre as nossas viagens, ele fazia perguntas sobre os destinos e sobre as nossas experiências. É triste ser proibido de conhecer o mundo… O dia seguinte foi dia de visitar o grande Potala!
A sua imponência é incrível e à medida que vamos subindo, parece ainda mais avassalador. Depois de passarmos por três checkpoints, começámos a saga de subir escadas, sempre com a nossa amiga “crossfitter”. Vêem-se muitos idosos, acompanhados pela família que lhes dão o devido apoio na subida, que sorriem com os dentes amarelados e pretos, alguns sem dentes até, e com os olhos quase fechados ao sorrir dizem “tashi delek” (significa tanto olá como prazer em conhecê-lo), levantando a mão em forma de concha, de palma para o céu ao nível da cabeça.
O edifício é composto por três partes distintas. A parte branca (dedicada aos templos, capelas e sítios de oração, está ligada ao clero), a parte vermelha (ligada ao governo e ministérios) e a parte amarela (onde viveram os Dalai Lamas, onde pudemos visitar algumas das salas que eles usufruíam). Desde o momento em que entrámos na parte branca (já depois de todas as escadas), nós turistas, tínhamos apenas 50 minutos para percorrer as capelas permitidas, cerca de 20, sendo que no total eram 999. Os locais não têm limite de tempo. Neste momento é época baixa no Tibete, mas mesmo assim vimos tantos locais, que nem conseguimos imaginar como será em época alta, com todos os turistas, para além dos locais…
Estes trazem todo o tipo de oferendas, desde fruta, tecidos, dinheiro, etc., fazem a sua reza e seguem caminho para a próxima capelinha, todos em grupo, apertadinhos para não se perderem. Muitos ficam espantados com a nossa presença e alguns querem mesmo tocar-nos e sorriem genuinamente, dizendo umas palavras em tibetano. Respondo sempre com um “tashi delek” acompanhado com o gesto da mão. De tarde, foi vez de visitar o último templo aqui em Lhasa, pois no dia seguinte já íamos arrancar para a Friendship Highway, onde vimos o Buda com 1.300 anos, o buda mais antigo do Tibete.
Em jeito de despedida de Lhasa, fomos fazer uma massagem feita por cegos, que parece existir por toda a cidade, durante uma hora. Custou 20€ por pessoa (não foi nenhuma pechincha), mas correu bastante mal… o massagista do Diogo que nunca tinha feito uma massagem na vida, arrotava para cima dele como um leão e o meu massagista, apesar de massajar muito bem, não era cego! Usava óculos de sol, mas puxava a mantinha para o lado para ver a cuequinha e para baixo para ver as maminhas! Pervertido!
O Diogo saiu de lá amassado e com a pele assada e eu de alguma forma exposta e abusada. À saída fizemos o gesto de adeus com a mão, em forma de teste, e o meu massagista respondeu com o mesmo sinal. O dia seguinte começou mais cedo do que o costume, para aproveitarmos ao máximo esta nova aventura. A época alta na região é Julho e Agosto, o que não faz sentido por ser a época das monções e ser muito complicado ver os Himalaias, para além de estar sempre a chover e o risco de derrocadas ser maior.
Nesta altura do ano não há praticamente turistas e o céu está sempre limpo. Graças a isso, tivemos o privilégio de irmos sozinhos numa carrinha de 13 lugares no que acabou por ser uma viagem privada, paga como partilhada, onde pudemos decidir melhor o percurso e parar quando e onde quiséssemos.
A Friendship Highway era um destino que há muito sonhávamos e pelas fotos e vídeos que vimos, tínhamos uma expectativa muito alta. Saímos do hotel às 8h20 e iniciámos a nossa viagem com o nosso guia e o condutor, para uma viagem que iria demorar três dias. A primeira paragem foi num “viewpoint”, onde tinham Mastins Tibetanos em “exposição” e por 10rmb podíamos tirar fotos com eles.
O Diogo fez uma sessão fotográfica com um deles e eu vi uma cabritinha branca toda enfeitada, muito pequenina, em cima de um muro. Era tão irresistível que dei 10rmb à senhora para tirar fotos com ela. Ela pôs a “blanquita” no meu colo e demos um abraço tão bom que o meu coração derreteu. Ela cheirava tão bem! Estava limpinha, super bem escovada, cheirosa e toda pindérica! Um amor!
Continuámos a viagem até chegarmos aos 4.900 metros de altitude para vermos o lago Yamdrok com as montanhas dos Himalaias cheias de neve como pano de fundo. O azul do Yamdrok contrastava com as montanhas e faz pandan com o azul do céu. Estava tão calmo e parado que refletia na perfeição as montanhas.
Tudo é tão magnificente e sereno que nos transmite calma e paz. Percorremos os kms necessários para chegar a um glaciar, que cai pela montanha dando uma sensação avassaladora e ao mesmo tempo assustadora. Devido à altitude a que está, 7.100 metros, o branco do glaciar fere a retina, sendo impossível olhar diretamente para ele sem os óculos de sol postos.
Em todas as paragens que fazemos vemos tibetanos a vender pedras preciosas (supostamente) trabalhadas ou polidas ou mesmo com insectos lá dentro. “Real stone”, dizem eles! “Looky, looky!”, enquanto nos espetam com as pedras à frente dos olhos quando o que nós queremos é tirar fotos ao lago ou ao glaciar, etc.
E nós respondemos “No cash, sorry! Only credit card.” porque sabemos que na China os cartões de crédito estrangeiros não funcionam. E eles desistem. O nosso guia avisa-nos sempre das aldrabices e aconselha-nos da melhor maneira que sabe.
Chegámos ao nosso destino final do dia de hoje, Shigatse, a segunda maior cidade do Tibete, apesar de ser bem menor e menos desenvolvida do que Lhasa.
Fomos comer carne grelhada a um restaurante dentro de um centro comercial e super difícil de encontrar, obrigando-nos a subir e a descer todas as escadas do shopping pelo menos umas 4 vezes. Foi um dos seguranças do shopping (que nem estava identificado como tal, só percebemos que era porque andava com um walkie talkie na mão) que nos levou ao restaurante, nos deu o menu e nos ajudou a escolher o que queríamos comer.
Estas situações são muito frequentes e acabam por ser hilariantes, com eles a falarem connosco em chinês, como se nós fôssemos compreender alguma coisinha. Não vá alguma palavrita ser parecida e dê para tirar pelo sentido… Mais uma vez, “ingrish” não há e linguagem gestual só se for em chinês, porque a universal aqui não funciona.
Acabámos por pedir um combinado de diferentes tipos de carne, um prato de cogumelos e duas coca-colas, que acabou por ser comida a mais. A surpresa deste restaurante, para além de estar muito bem decorado, ser grande e airoso, é que eles têm o próprio talho adjacente. Conforme os pedidos vão saindo, no talho vão fatiando a carne congelada para ser grelhada na mesa pelos clientes. Brilhante!!
Comemos cinco carnes diferentes e só uma delas é que estava um pouco dura. Duas vinham temperadas com um molho caseiro picante (que o Diogo acabou por comer tudo), mas uma delas estava especialmente saborosa e tenra. Todas as mesas têm o próprio grelhador a gás com um extrator individual. Há uma mesa central com vários tipos de molhos (soja, teryaki, pasta de amendoim, chilis, etc) e vários condimentos (amendoins partidos, açúcar, sal, coentros, cebolinho, salsa, etc), tudo para se compor molhos diferentes e temperar a carne. Para grelhar usam um óleo de amendoim e vinagre de arroz, tudo muito suave e delicioso.
Fomos dormir que nem dois koalas barrigudos, bem cedo para acordar no dia seguinte para irmos ao tão desejado Evereste! Mal podíamos esperar por ver o Evereste. Até acordámos antes da hora do despertador, tal era a ansiedade! Este hotel, apesar de ser de 3 estrelas e o de Lhasa 4, parece-nos bastante superior ao outro. Ficámos no melhor quarto com duas casas de banho, uma sala de estar, 2 televisões, cama king size, com o teto todo pintado e decorado com motivos tibetanos. Um problema: quando quisemos tomar banho não havia água quente! Passa aí os dodots, que vamos tomar banho como gatos.
O pequeno-almoço também foi superior ao de Lhasa e saímos contentes para fazer as 9h até ao Evereste. A primeira paragem foi no marco de 5.000km desde Shangai onde brincamos com uma vaca que só queria companhia e mimo na cabeça. Queria entrar à força num dos carros. Foi uma risota só! A paragem seguinte foi o pico mais alto da nossa viagem e das nossas vidas até hoje, 5.247m.
Estava uma ventania, que quase levava todas as bandeiras que lá estavam expostas. Ao longe via-se a cordilheira toda coberta de neve! Tirámos fotos o mais rápido que conseguimos e voltámos a refugiar-nos no quentinho do carro. Depois de meia hora a conduzir, vimos o Evereste, maciço, bem lá no alto, em toda a sua magnitude, exibindo o seu pico perfeito triangular. Ao lado dele, as outras montanhas parecem minúsculas. Parámos para tirar fotos e fizemo-nos à estrada para irmos almoçar.
Aqui no Tibete é permitido fumar em todo o lado, o que é bastante desconfortável, comer com este cheiro intenso a pairar debaixo dos nossos narizes. Depois do almoço, entrámos numa estrada que serpenteia as montanhas, enquanto subíamos para o topo. Estávamos tão entretidos e distraídos a tirar fotos à “snake road”, que de repente, no cimo da montanha, olhámos para o outro lado e vimos uma grande parte da cordilheira dos Himalaias que parecia querer-nos devorar. O guia disse o nome dos picos mais importantes, mas nós estávamos ali pelo Evereste, a estrela principal de um filme de Hollywood, com todas as atenções, objetivas e flashes viradas na sua direção!
Não nos restam dúvidas que esta é a melhor altura para vir a este destino! Connosco estavam mais cinco ou seis pessoas, todos chineses, à espera da sua vez para tirar fotos. Nem imagino como será no verão, que vêm cá centenas de pessoas! Tirámos todo o tipo de fotos e voltámos para dentro do carro. O vento é gelado e corta tudo por onde passa… é impossível ficar fora do carro mais do que alguns minutos e mesmo assim ficamos logo com os pés e a cara gelados! Mas o melhor ainda estava por vir! Quando chegámos ao campo base, bem, como explicar… é avassalador e maravilhoso! O frio, mais uma vez, é insuportável, mas a vista era inacreditavelmente majestosa!
Saltámos, dançámos, construímos uma stupa com pedras onde amarrámos o nosso lenço branco, fomos visitar o templo budista mais alto do mundo e fomos para o campo base pousar as nossas malas, comer e dormir. Tínhamos decidido que íamos dormir no campo base, cedo nessa manhã, pois era uma experiência única e não íamos deixar que o frio e o desconforto nos roubasse isso. Mas, confesso, que não foi nada fácil.
As camas tinham uma manta elétrica por baixo dos lençóis que nos aqueceu no início da noite, mas depois desligaram a eletricidade e parecia que estávamos a dormir ao relento, mesmo estando a dormir vestidos com a roupa mais quente que trouxemos para esta expedição. Dormimos mal, obviamente, e só de pensar em ter de sair de baixo dos dois edredons que usámos, para fazer xixi, a bexiga encolhia-se e aguentava. Que remédio! O problema é que não se consegue dormir assim. Ou seja, fomos para a cama às 9h30 e acordei às 3h30 e pouco mais dormi. A única parte do corpo que estava fora dos edredons era a cabeça e essa estava tão gelada que até doía! O verdadeiro significado de “brain freeze”! O colchão era duro que nem pedra, parecia uma tábua de madeira e magoava nos ossos e articulações. Dormimos bem agarradinhos, em conchinha, para dormirmos bem quentinhos. O ar era tão frio e seco que o nariz entupia e ao respirar pela boca, a língua e a garganta secavam de tal forma que acordava com a língua dorida, seca e dura…
No dia seguinte, sair da cama custou mais do que arrancar um dente sem anestesia, tal era o frio que se instalou no quarto. As garrafas de água estavam congeladas e os telemóveis tão frios que quase nem dava para pegar neles. Tinham nos dado um termos com água quente para fazermos chá de manhã e isso foi a primeira coisa que fizemos, mal saímos da cama. Esvaziámos a bexiga para uma bacia (um penico!), lavámos os dentes, guardamos tudo na mochila e partimos do campo base com um misto de “isto é maravilhoso, lindo de morrer, de tirar o fôlego, avassalador” e um “já chega de dureza, dêem-nos algum conforto, ok?”!
A verdade é que alcançámos mais um grande objetivo pessoal que se tornou numa grande aventura! A estrada do campo base até Old Tingri, uma vila tradional tibetana, onde íamos almoçar, é uma estrada secundária, cheia de pedras, buracos, riachos que atravessam a estrada e viram gelo, lagos de sal, ratos da montanha que correm para se esconderem à medida que nos vamos aproximando, montanhas coloridas, os glaciares, os Himalaias que nos acompanham sempre e deserto. É lindo demais para descrever com justiça…
Num constante sobe e desce a montanha, em “snake roads”, as vistas vão-se alterando de forma gradual e a presença dos Himalaias é uma constante. Quando vemos um pico de uma montanha com uma espécie de nuvem a sair dela, significa que esse pico tem altura suficiente para competir com o Evereste. Essa nuvem é neve a ser arrastada pelo vento. Os Himalaias assemelham-se a um mar alto picado mas estático e branco que parece querer engolir tudo o que o rodeia, com espírito agressivo, com escarpas de lâminas bem afiadas que cortam o azul intenso e pacífico do céu.
Estamos a ter muita sorte com o tempo, pois, apesar do frio, ainda não vimos uma única nuvem no céu, o que comprova uma vez mais que esta é a melhor altura para vir cá. O nosso guia contou-nos que em maio e setembro, época das escaladas, o campo base abriga 77 tendas, em que cada uma dá guarida a cerca de 25 pessoas, dando uma média de quase 2.000 pessoas. Subir ao Evereste custa 60.000 USD e muitas das pessoas não chegam a subir por incapacidade física no momento do ataque ao pico, ou por a meteorologia não o permitir.
Depois de nos serpentearmos através de desfiladeiros a pique, de paisagens dramáticas, decoradas com pinheiros e cascatas congeladas, chegámos a Gyirong, a vila mais perto da fronteira com o Nepal. Como ainda não tínhamos almoçado, fomos comer alguma coisa que estávamos esfomeados. É preciso referir que o controlo de velocidade aqui é feito de outra maneira. Existem câmaras no inicio e no final de determinado percurso e se demora x minutos a percorrer esse percurso, não podem passar na câmara final antes do tempo. Então, o que eles fazem é parar em determinados viewpoints, deixam os turistas tirar fotos para compensar o tempo que não gastam por irem mais rápido.
No carro existe uma câmara ao lado do espelho retrovisor para controlar o que se passa lá dentro. Têm também um sistema de alerta, que os avisa quando passaram mais de 4h a conduzir e pede para parar durante 20 minutos, incessantemente até que se pare. Vimos muitos turistas a fazer este percurso de bicicleta e de mota. Só não sei como é que aguentam o frio que com a deslocação fica ainda mais intenso… Os guias são obrigatoriamente tibetanos e nunca se separam dos seus turistas, obrigando-os a fazer o mesmo percurso, da mesma forma e a dormirem nas mesmas condições, que para nós é “once in a life time experience”, mas para eles é mais na base do “daily basis”.
Esta vila parece estar ainda em construção e há zonas que parece que caiu uma bomba e partiu tudo: um pardieiro, no verdadeiro sentido da palavra. Está espremida num pequeno vale, no meio dos Himalaias, sentindo-se a pressão das escarpas brancas, onde em todas as ruas se veem paisagens incríveis. Como ainda estamos na China, continuamos a ver pessoas a cuspir para o chão (e digo pessoas, porque são tanto homens como mulheres a fazê-lo, apesar de ser 1.000 vezes mais nojento nas mulheres), as câmaras de vigilância continuam presentes e fuma-se em todo o lado.
Não podemos deixar de tecer o nosso comentário relativamente à mania que as pessoas têm de arejar os espaços fechados. Relembro que não estamos a falar de um país tropical, mas sim de um país em que as temperaturas chegam facilmente aos -15 graus (real feel -200!). Bem sei que nós não somos um bom exemplo, porque nunca abrimos as janelas para arejar. Abrimos quando queremos ir lá fora ou quando achamos que está cheiro a comida. Mas muito menos vamos arejar a casa com temperaturas abaixo dos 0 graus! Ora bem, por estes lados, todas as portas e janelas estão escancaradas para trás como se estivessem 40 graus à sombra e estivéssemos todos a suar do bigode!
Não… eles próprios trabalham de casaco vestido, claramente cheios de frio, constantemente a fungar do nariz. Acendem fornalhas dentro de casa, sentam-se à volta daquilo, com as pestanas quase a ficarem queimadas pelo calor exagerado, com um cheiro a fumo que pica nos olhos e faz os pelos do nariz encaracolarem-se todos, mas fechar as janelas e as portas, não, não é preciso. O que é preciso é arejar a casa, que está com um ar abafado. Pelas alminhas!! Da mesma forma que cospem na rua, cospem dentro de casa. Sim, sim. É para um baldinho, que anda espalhado pela casa, não vá de repente descer aquele monco e ser preciso puxar bem o escarro para limpar as cordas vocais… podem ser chamados para cantar a qualquer momento. Nunca se sabe! E isto acontece a cada 2 minutos. É uma sinfonia de escarranços! Lindo de se ouvir!
Assim como é hábito vermos chinocas a limpar o nariz em plena via pública. Não metem o dedo no nariz, não! É menos invasor. Pressionam uma narina, inclinam-se para a frente, e fungam com força para o meio da rua, saindo um pequeno spring roll de monco. Depois é só repetir o processo para a outra narina. É bonito de se ver! Isto quando não o fazem mesmo ao teu lado e te salta um chao mein para as calças!
Outra coisa que não lhes assiste é limpar o pó. A expressão “chinesinho limpó pó” está absolutamente errada. Sim, aquela camada cinzenta que cai na mobília e que se não passar o paninho, tudo o que está minimamente na horizontal vira monocromático! Tons de cinza, super na moda! Aqui em Gyirong, ficamos no melhor hotel da cidade, supostamente, mas varrer o chão e limpar o pó? Dá muito trabalho… e para quê? A seguir vem um chinês e suja isto tudo de novo… Coitadinha da menina que nos veio abrir o quarto… acho que nunca trabalhou tanto na vida dela.
Primeiro, trocámos de quarto, porque deram-nos um quarto com cama king size, mas com sanita à caçador! E nós que só queríamos libertar o Mandela! Levou-nos para outro quarto, mas estava imundo. Então, limpou o pó (mal e porcamente, passando um pano já sujo a fingir que limpava), foi buscar um aquecedor (que ao respirar mais parecia que estávamos a fumar um cigarrinho), foi buscar papel higiénico (porque não havia no quarto) e depois disto tudo e de ela se ter ido embora (deve ter pedido férias prolongadas ao chefe depois de tamanha estafa), descobrimos que as mantas elétricas não estavam a funcionar… Tomámos um duche rápido, que aqui a água quente acaba enquanto o Buda pisca os olhos, e fomos jantar, depois de mil e uma tentativas de tentar pôr as mantas a funcionar.
Ao voltar de jantar, chegámos ao quarto e ainda se fazia sentir um verão soviético. Então, fomos a um quarto ao lado, que tinha a porta aberta (não fosse ficar demasiado abafado lá dentro) e “roubámos” outro aquecedor para o nosso quarto. Com as mantas sem funcionar, enfiamo-nos na cama de onde vinha uma aragem do pólo ártico (quase achei que ia sair de dentro da cama um urso polar!) e tentámos adormecer o mais rápido possível. Amanhã partimos para o Nepal, felizes por irmos para o calor e tristes por deixarmos o Tibete para trás. Vamos finalmente ter acesso livre à internet, sem repressões e a nossa vida poderá girar de novo à volta do Google! Apesar de tudo, foi uma aventura dura mas inesquecível!
O dia começou com dores no corpo todo devido ao colchão asiático tipo pedra que nos acorda varias vezes durante a noite devido às dores articulares que causa. O quarto estava bem quentinho graças aos 2 aquecedores que conquistamos na noite anterior, em modo Vasco da Gama. À nossa espera estavam os zelosos Lobsang e o motorista (do qual não sabemos o nome porque não falava nada de inglês). Lobsang além de guia, gosta de caligrafia e de magia nos tempos livres, para além de cantar bem. Fez-nos alguns passos de magia e revelou-nos alguns truques. Com 9 anos foi estudar para a Índia e para o Nepal e durante 16 anos não viu os pais. Voltou a entrar no país graças ao suborno de militares chineses e posteriormente conquistou a formação de guia, contra a vontade do regime já que os turistas preferem os guias locais e não os chineses.
À saída do quarto todos os corredores e receção estavam gelados graças às portas e janelas escancaradas do Hotel. Fomos tomar o pequeno almoço ao mesmo local onde tínhamos almoçado e jantado na noite anterior, um agradável restaurante nepalês, com medo de apanharmos uma intoxicação alimentar. Temos estado invictos e apesar das condições desta expedição por vezes serem extremas temos tido a sorte do nosso lado.
Depois de mais 3 checkpoints, num total de 16 desde Lhasa, lá chegamos à fronteira. Os tibetanos estão impedidos de sair do país e o controlo é severo já que todos anseiam e têm como objetivo de vida juntarem-se ao Dalai Lama nos Himalaias indianos (região de Darjeling) onde se encontra refugiado.
A China invadiu militarmente o Tibete durante a revolução cultural em 1959 (iniciou a entrada na parte leste do país em 1951) com o propósito de libertar o povo do sistema feudal de castas em que os nobres detinham escravos. Libertaram, é um facto, mas nunca mais saíram e com a migração massiva da população para a Índia e para o Nepal encarceraram-nos no país, sendo apenas permitido deslocarem-se dentro do território chinês e com permissões e justificações claras para tal. Durante o trajeto, víamos a cerca eletrificada, com arame farpado e as câmaras de vigilância que separavam a margem chinesa da nepalesa. O rio é pouco fundo e não é difícil atravessar nesta altura mas tem uma corrente forte. Em vários pontos conseguíamos ver a cerca cortada ou deitada abaixo adivinhando locais de fuga. Há vários tibetanos que atravessaram a pé os Himalaias e hoje em dia vivem no estrangeiro, alguns sem dedos, pés, mãos ou mesmo cegos devido à retinite induzida pela altitude.
Ao chegarmos à fronteira a travessia foi fácil e lá nos despedimos do nosso querido Lobsong, o mágico, com um forte e sentido abraço. Na fila reconheceu o colega nepalês do outro lado que nos ia ajudar a chegar ao autocarro e lá passou o testemunho. Depois de passarmos o primeiro check às nossas malas, abrindo todos os recantos à procura de contrabando, o nosso guia nepalês lá pôs as nossas malas na parte de trás de um jipe e a Filipa, que não se deixa levar facilmente, perguntou logo se este era o carro para Kathmandu. Ele disse que sim e que custava 190 dólares. Nós dissemos que tínhamos escolhido ir de autocarro e ele prontamente disse que já não havia autocarros para Kathmamdu. Armadilha óbvia! Eu pedi para nos levar ao sítio onde estavam os autocarros e ele disse que eram 10 dólares para fazer os 2 kms. Mas ele tinha sido nomeado para nos levar e agora queria 10 dólares para 2kms apenas?!
Depois de me rir na cara dele e de lhe perguntar o nome para reclamar junto da agencia, disse-lhe que ia a pé até aos autocarros e assim foi. Por um caminho lamacento e muito irregular, mas rodeado por uma paisagem avassaladora, circundados de montanhas, tivemos que pegar nas nossas malas e começamos a andar para fazer os 2 kms a pé. No caminho, de vez em quando passavam os camiões Tata enfeitados característicos do Nepal com carga para a China, que espirravam lama a toda a volta.
Passados 1,5kms encontramos o posto fronteiriço do lado do Nepal onde paramos para nos carimbarem o passaporte. O idiota nem àquele sítio nos levou, como era suposto. Rapidamente obtivemos o carimbo e o gajo la apareceu finalmente com o jipe cheio de chineses e chamou-nos quando já íamos a caminho dos autocarros para dizer que o último autocarro já tinha partido. Mentiroso!
Internamente mandei-o ir a um sítio que eu cá sei e virei costas, com os braços doridos, para percorrer o restante caminho lamacento. A meio deste caminho fomos mandados parar por 3 militares nepaleses que nos quiseram revistar as malas novamente. Eu disse que já tínhamos sido revistados mas eles estavam mais interessados em ver a roupa interior da Filipa, tendo-me até perguntado se ela era minha amiga. Enfim.
Aproveitei para descansar e tirar a camisola que comprei em Lhasa e que já não ia servir mais tendo dado a um dos militares. Passados 10 minutos, lá chegamos à prometida área dos autocarros. Ao chegar à pequena povoação havia uma miúda que falava inglês num supermercado e explicou-nos que o autocarro custava 500 rupias (cerca de 4 dólares) os primeiros 90kms e que depois numa determinada povoação apanhávamos outro por 300 rupias (2 dólares) até Kathmandu. O trajeto no total seriam 10 a 11h. Perguntamos à rapariga se não conhecia nenhum motorista e quanto é habitual custar a viagem e ela disse-nos 2500 rupias (20USD) por pessoa e que ia tentar ligar a alguns conhecidos.
Tal espanto quando a mulher do balcão do supermercado, que não dizia uma palavra em inglês, se antecipou e me passa o telefone. Era um motorista que estava disposto a ir até Kathmandu por 3000 rupias (25 dólares) cada um. Nem discuti o preço, disse logo que sim. Passados uns 10 minutos lá apareceu e depois de aguardarmos por mais 2 pessoas lá partimos. Por nós passavam jipes iguais ao nosso mas em vez de 5 pessoas levavam 8 com as malas em cima cheias de pó e a pagarem um absurdo por cada jipe. Quando paramos para almoçar, 3h30m depois, reconheci umas chinesas que estavam na fronteira e perguntei quanto estavam a pagar pelo jipe e ela respondeu 50yuan chineses cada um (cerca de 6,6€).
No email da Tibetdiscovery, empresa com que fomos obrigados a conhecer o Tibete (não há outra forma de o conhecer para não chineses), diziam que o autocarro até Kathmandu custava 30 dólares e o jipe 250 dólares por jipe e por isso estávamos radiantes com o preço que tínhamos conseguido para as cerca de 6h30 de viagem até falar com as chinesas e perceber que era um preço espetacular para ocidental mas que era muito alto para um chinês ou um local. Foi uma grande conquista para um ocidental e ficamos felizes por isso!
No carro íamos atrás e no lugar da frente ia uma mulher nepalesa que escarrava o tempo todo sem qualquer pudor, pedindo para abrir o vidro e poder cuspir tudo aquilo que estava dentro dela. Pensamos que ia sair o intestino pela boca.
Fora isso a viagem foi feita sempre num poeirento caminho de cabras com violentos solavancos e a apenas poucos centímetros do precipício. A paisagem continuava surpreendente com socalcos de arroz incrustados em montanhas com mais de 4000-5000metros e que faziam lembrar o alto douro vinhateiro mas em montanhas 10 vezes maiores. Pelo caminho tivemos mais uns 4 checkpoints e tivemos que abrir as malas mais uma vez, logo no início, à procura de contrabando chinês. Mais perto de Kathmandu a estrada já tinha direito a uma camadita de alcatrão mas os buracos e os violentos solavancos foram uma constante.
Chegamos a Kathmandu 8h depois em segurança apesar de várias vezes termos visto a nossa vida mal parada devido às ultrapassagens nas curvas, Nepali style. O que atrasou mais foi o transito caótico de Kathmandu no qual passamos 1h30m desde a periferia até Thamel. Não almoçamos direito mas agora vamos ter um jantar como deve ser no nosso confortável hotel a beber algum álcool para comemorar.
Tibete – dicas
Hotel Tibete
No Tibete é necessário um tour guiado e por consequência não fomos nós que marcamos nada. Apenas marcamos o comboio até Lhasa e a partir da nossa chegada andamos com um guia até à fronteira com o Nepal.
Tibete – formas de deslocação
No Tibete é obrigatório andarmos com um guia, sempre.
Dicas e pontos de interesse no Tibete
- Potala Palace
- Jokhang Temple
- Mount Kailash
- Barkhor Street
- Nu River
- Sera Monastery
- Everest Base Camp
- Ganden Monastery
- Zhuomala Mountain Pass
- Drak Yerpa
- Qomolangma National Nature Preserve
- Namu Na’ni Peak
- Yamdrok Yumtso Lake
- Rongbuk Monastery
- Manasarovar Forest Park