Komodo

Chegados de Raja Ampat, fizemos uma pequena escala em Bali, antes de irmos para as Flores. Bali não foi uma desilusão na primeira paragem e desta vez não foi diferente. Como era só uma noite e uma manhã, decidimos ficar o mais perto possível do aeroporto e por isso optámos por ficar no Cara Cara Inn, um hostel super giro e trendy, em Kuta Beach. Como da última vez, no momento em que pusemos o pézinho em Bali, a sensação de bem estar voltou e a boa vibe instalou-se. “There’s Bali and then there’s the rest of Indonesia!”, ouvimos dizer e concordamos totalmente. Bali é muito ocidentalizado e uns 50 anos à frente do resto da Indonésia. A cultura hindu-balinesa vem acompanhada com espiritualidade ao virar de cada esquina, com templos minúsculos escondidos no meio de lojas, bares, cafés e restaurantes. As pessoas vão aos micro templos com um pratinho de arroz e velas, fazem uma reza e seguem a sua vida. Kuta não é tão mágico como Canggu, mas também fica no nosso coração pelos concertos ao ar livre, pelos bons restaurantes (super baratos) e pelo surf, apesar da praia estar repleta de lixo. O Diogo contou que ao surfar, a remar, apanhava sacos plásticos e caixas de comida vazias. De facto, é uma pena os indonésios não terem educação ambiental, porque deitam tudo ao chão ou para a praia, sem pensar na beleza natural, no ambiente, nem no estrago que fazem ao turismo.

Explora a nossa viagem a Raja Ampat.

Visto que em Raja Ampat passamos fome, decidimos que era uma excelente idéia irmos comer um sushizinho bom e encher o bandulho até sairmos a rebolar. Pedimos um barco com 32 peças, mais 16 à parte… era tanto sushi que no final até o estômago nos doía! Fomos para a cama gordos e satisfeitos por tirarmos a barriga de misérias. De manhã, fomos até à praia para o Diogo surfar durante 1h, fomos comprar os nossos típicos souvenires e a seguir valeu-nos uma bela de uma massagem mesmo em frente ao hostel. Que rico! Que nem reis, super relaxados, chamámos o uber para irmos para o aeroporto apanhar o voo para as Flores.

Tudo correu sobre rodas, sem grandes percalços, e quando chegámos a Labuan Bajo, fomos de táxi (custa 50.000$RI e é organizado, sem haver hipótese de discutir preços) até ao Dragon Dive Komodo Hostel, um paraíso no meio do Iraque! A pequena cidade/vila parece destruída por uma bomba e este hostel com uma pequena piscina, bar com happy hour, pizzas feitas em forno de lenha e casa de banho privada, parece um oásis no meio do deserto. O quarto tinha muitos mosquitos, incluindo dentro da sanita e no cesto do lixo, mas já vinha preparado com uma espécie de “dumdum” de ligar à tomada e nós tínhamos outro comprado em Leça, mas mesmo assim, pedimos um spray para mosquitos que nos foi dado com muita prontidão. Vaporizamos o quarto todo e fomos para a piscina, enquanto que esperávamos que os mosquitos fossem desta para melhor. Foi tiro e queda, literalmente! Quando voltámos ao quarto para trocarmos de roupa para ir jantar, não havia sinais deles! Até o funeral já devia ter sido feito, porque nem os víamos no chão… Que alívio! Optámos por ir comer a um restaurante muito perto do hostel porque não nos apetecia pizza e comemos uns camarões com caril muito bom. Fomos para a cama relaxados e dormimos como anjinhos.

No dia seguinte vieram-nos buscar às 9h00, depois de um bom pequeno almoço de Páscoa, para irmos para o barco. Confesso que estávamos um pouco ansiosos pela curiosidade de ver como seria o sítio onde íamos passar a próxima semana. Depois de uma curta caminhada, chegámos ao “porto”, que de porto não tinha nada, onde estava um pequeno barco de madeira, com a tinta branca e vermelha a descascar por completo, com o fundo cheio de lodo. 

Era fácil imaginar um bando de refugiados a fugir da Síria nele, todos amontoados a passar o mediterrâneo, magros e cheios de fome. Então, a partir daquele momento o barquito passou a chamar-se “refugee boat”!

Depois de uns curtos 5 minutos, avistámos o barco, de casco branco, com a estrutura em madeira não pintada e o tecto de cor vinho tinto. Era um barco velho de um só mastro, com uma pequena sala interior, 2 quartos no piso inferior e 1 quarto no “main deck” cá fora.

Tinha um piso superior onde estava a sala de comando e um pequeno terraço descoberto com puffs para apanhar sol. Cá em baixo, no deck principal, também havia um espaço coberto com colchões e puffs, ao lado das botijas de oxigénio e todo o equipamento de mergulho. Que maravilha! Isto é a nossa onda! Pousámos as malas num dos quartos do piso inferior, pensando que no deck íamos passar imenso calor, e instalámo-nos no deck coberto um em cada puff, à espera de conhecer as pessoas que nos iam acompanhar esta semana. Uns minutos depois chegou uma dinamarquesa chamada Sanne, loira, super bronzeada, com 51 anos, que vive em Copenhaga. Começámos a conversar e ela disse que estava a viajar desde fevereiro. Começou com um liveaboard de um amigo nas Maldivas (para onde já costuma ir habitualmente, recomendando esse destino vivamente para mergulho), foi para a Tailândia, Camboja, Bali e agora estava aqui. Tinha tirado um ano de licença sem vencimento que acaba em setembro e não sabia para onde ia a seguir. Quem nos dera estar na situação dela… “ah e tal, não sei para onde vou a seguir… tenho até setembro para ter de voltar e não sei o que fazer.” “Shit!”, pensei eu! Eu daqui a 8 dias já estou em frente a um computador, a atender telefonemas, a levar com as mentiras dos fornecedores, a ouvir reclamações de clientes, a cobrar dívidas e a fazer orçamentos e desenhos técnicos. Ela tem 6 meses pela frente até ter de voltar. Mas por outro lado, eu adoro de paixão o meu trabalho (ela não), morámos num sítio porreiro (bem, ela também!), a primavera deve estar aí a rebentar (e o verão vem logo atrás), tenho saudades da minha Mafalda, da minha mãe, dos nossos amigos… “life ain’t so bad!”

Distraídos a conversar, nem reparámos que o barco começou a andar. Íamos ser os únicos no barco, só nós os 3, mais o dive guide, o cozinheiro, o comandante, o rapaz que arruma os quartos e põe a mesa e o rapaz que trata das botijas de oxigénio e do equipamento de mergulho. TOP!!

A semana passou com 3 mergulhos por dia, exceto no primeiro dia (só fizemos 2) e na quinta que fomos ver os dragões de Komodo (são gigantes e assustadores), com comida absolutamente maravilhosa (chegámos a comentar que não sabíamos como é que o cozinheiro, que era super novo, conseguia cozinhar numa micro cozinha e naquelas condições) e com vistas de perder o fôlego e pôr do sol com cores fabulosas. 

Aqui dos mergulhos esperam-se grandes correntes e por consequência grandes peixes. Aqui o melhor dos mergulhos são os grandes tubarões e peixes (que parece que alguém lhes deu adubo de tão grandes que são, quando comparados com os da mesma raça mas de outros sítios da Indonésia) e o coral com cores, tamanhos e formas inesquecíveis. Aqui faz-se “current dive” e “drift dive”. Passo a explicar. Num current dive, fazemos uma entrada negativa que consiste em entrar na água diretamente do barco e em vez de vir à superfície dar o sinal que está tudo bem, limpar a máscara e esperar pelos “buddies” que ainda não saltaram do barco, com uma entrada negativa todos saltamos ao mesmo tempo e mal se entra na água começa-se logo a descer porque a corrente é tão forte que se esperarmos à superfície somos levados. Note-se que para chegar lá baixo é preciso lutar contra uma corrente super forte (barbatanas longas aqui são um “must have”, sendo que eu tenho umas micro), “dar ao kick” com toda a força que se tem durante cerca de 3 minutos onde se gasta um quarto do oxigénio, sendo que os outros três quartos duram uma hora. Uma vez lá em baixo, a 25 metros de profundidade, pegamos no gancho e prendemos a um pedaço de coral, enchemos o colete com oxigénio que nos faz levantar, cruzamos os braços e as pernas e esperamos que a magia aconteça. É como estar no cinema (faltam as pipocas) a ver um filme de acção! De vez em quando damos uma olhada no oxigénio, damos um check nos nossos parceiros e vamos vendo tudo a acontecer.

Num “drift dive”, volta a ser uma entrada negativa, de novo nadar contra a corrente fortíssima até aos 25 metros de profundidade e aí deixamo-nos levar pela corrente, parecendo que estamos a voar, livres mas a uma velocidade de um carro de corrida.

Vimos tubarões e atuns a caçar, napoleões a passear e a comer coral, peixes papagaio azul cobalto do tamanho de vacas a trincar pedaços gigantes de coral, raias a limpar as guelras, mantas gigantes (algumas com 4 metros de comprimento) a voar e a dançar à nossa frente e os peixes mais pequenos do recife a passearem ou a namorarem ou a expulsar outros peixes das suas casas! É tão giro… De vez em quando vemos um peixe escorpião ou um peixe pedra camuflados no coral, um peixe sapo com as suas patinhas agarradas ao coral com as suas cores fortes a contrastar com as cores do coral. Muitos “nemos” nas suas anémonas laranja forte, partilhando casa com os camarões que nos vêm limpar as unhas e com os caranguejos assustadiços que se escondem por baixo das anémonas ou atrás dos nemos. Vimos uma cobra a passear pelo recife, moreias sempre a abrir e a fechar a boca, com peixes e/ou camarões a limpar-lhes os dentes, peixes balão do tamanho de cães que se deixam levar pela corrente nadando de uma forma estranha mas muito engraçada, garoupas, bacalhaus, os “sweet lips” com os lábios grossos e voluptuosos, nudibrancos de todas as cores, tamanhos e feitios… bem, eram tantos peixes que nem dá para contar. 

Aqui no barco o nosso dia a dia resumiu-se a dormir, mergulhar, comer, dormir, mergulhar, comer, dormir, mergulhar, comer, jogar Ludo, dormir e no dia seguinte tudo se repete de novo. A famosa frase “Dive, sleep, eat, repeat” encaixa-se na perfeição aqui “and life couldn’t be better!” O único problema da semana neste barco foram as baratas… durante o dia dormiam, mas mal o sol se punha, lá vinham elas, gordas como ratos (aqui tudo vem vários tamanhos acima, até as baratas) para comerem. Matamos 4 gordas (vêm com creme dentro! NOJO!) e várias pequenas, sendo que uma das pequenas me subiu pela perna acima, num daqueles momentos em que só pensas “vai ser só um cabelo, vai ser só um cabelo! Respira!” e olhas e é uma barata! Dei-lhe logo um empurrão direto para a água! “Agora és comida para peixes!”, pensei eu. E uma outra vez, quando ia a pegar na tablete dos comprimidos do enjoo e uma das grandes estava refastelada em cima dela e eu quase que peguei na barata em vez da tablete… NOJO! Quase vomitei! Este barco precisava de uma reforma ou de, no mínimo, uma desinfestação geral e profunda! De resto, correu tudo muito bem e foram uns dias bem passados, em boa companhia (já temos onde ficar em Copenhaga). A Sanne é SUPER divertida, está sempre pronta para uma piada, para o sarcasmo e humor negro, bem ao nosso estilo. Ao segundo dia já era a “second wife” e foi “adoptada” com muito carinho. Ela prometeu uma visita ao Porto e nós a Copenhaga, com muito gosto! Todas as noites era “Ludo Time”, com o Peter (o nosso guia de mergulho) com sede de nos matar a todos e que o matassem a ele, dando origem a risadas e piadas. Era sempre prometido que no dia seguinte, lhe íamos fechar a garrafa de oxigénio a meio do mergulho, cortando o fornecimento de ar, matando-o a ele debaixo de água! Eram trocados nomes carinhosos como “Bitch!” e “Fucker!” sempre que alguém “comia” alguém e todos nos ríamos!

A uns escassos momentos de voltar à realidade, fica na memória desta viagem Bali com toda a sua “good vibe” (e a promessa de voltar), a história portuguesa de Timor, o calor de Singapura, os “aliens” de Lembeh, a má comida e o tubarão de pontas prateadas de Raja Ampat e a Sanne e os grandes animais de Komodo! 

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